FLORES DE PELE

(parte 1)

                 Laerte Antonio

 

Estes são poemas que muitos diriam: eróticos, mas você é quem deve julgá-los. Eu espero que ao navegar neles, sinta as flores de pele assim como eu senti da primeira à última palavra. Seja bem vindo(a)

 

          Operação-Carrapato

 

Jeitoso tirarei seus carrapatos —

um por um com a pinça feita de unhas...

Os das partes pudendas vários tatos

exigem: outras artes e mumunhas...

 

São bichos sensuais e sem recatos,

a permitir aos dedos façam cunhas

pra adentrarem o esconso dos relatos

da carne em suas dobras e pupunhas...

 

Com calma tirarei esses bichinhos

até das bordas da frondosa ilhota —

mas com jeito virtual, não com espinhos...

 

Te aliviarei do triste comichão

e buscarei inusitada rota —

fazer amor do avesso do tesão.

LA 08/0

 

 

 Escatológico

 

Quero passar, amor, o fim do mundo

na tua alcova em tom crepuscular.

Enquanto outros se dão a furibundo

cismar, eu quero dar-me a calmo pinxotar.

 

Por um transar assim tão vagabundo —

em ritmo de esquecer de me lembrar,

é que quero, em desprezo bem profundo,

me seja o escatológico trepar.

 

Orgasmo, amor, orgasmo até nas tripas —

a escorrer da corola das tulipas

fimbriando nossos sonhos já defuntos...

 

E nesse escatológico momento

convidaremos para o acabamento

o velho mundo: acabaremos juntos.

LA 08/01

 

 

        Cotação

 

 A mulherada

               ( nem todas, sei, nem todas:

               só um punhado delas )

devia ver que não está

com essa xiranhose toda.

Um pouco mais de humildade

faz bem até pra caceta —

que é o principal instrumento

de cortejá-las

e amá-las.

Por outro lado, aos homens igualmente

( sim: sem tirar nem pôr )

aconselho humildade, pois sem elas

com suas fiéis mumunhas

e divinuras

a gente nunca mais que poderia

ter esse luxo

de cozinhar a lenha.

LA 08/01

 

 

 

                              Pão Caseiro

 

Já não ligava tanto para sexo —

ou seja, para homem mais nenhum...

Morto o marido, já não tinha nexo

portar-se qual besouro, qual anum...

 

Aliás ( pensava, pondo a mão no plexo ):

Dependendo das jóias e debrum,

a mulher põe qualquer olhar perplexo —

sobretudo as de cônjuge incomum...

 

A gente ( repensava ) vira totem

de cônjuge e de filhos... “Que não botem

o podre olhar naquilo que é sagrado!”

 

Pensava assim, enquanto, sem receio,

seu caseiro, um crioulo bem sarado,

sem cerimônias, a rachava ao meio.

LA 08/01

 

 

       Naquela Noite

 

Naquela noite

ventava, e ventava forte.

Chovia, e chovia chiado.

O mundo nos despencava

em trovoadas e estalos.

 

Naquela noite

lufadas de vento e chuva

davam socos na vidraça,

implorando para entrar...

 

Naquela noite

gemidos mordiscavam a penumbra

cheirosa do grande quarto —

almas molhadas de chuva...

 

Naquela noite

segurei-me (com as duas mãos)

na tua bunda —

com medo de resvalar

para fora da cama.

LA 09/0

 

 

                    A torre

 

Bela demais a torre de marfim

que para nós construí: muitos andares...

Foi-te dada a impressão de caminhares

pelo céu a comer amendoim...

 

Além de amor, fazíamos pudim

e goiabada de florir os ares...

Quantos narizes a lembrar seus lares,

e nobres a arrotar bolos de aipim...

 

Depois subíamos bem lá no cimo,

chupavas teu sorvete — o velho esquimó —,

e dançavas pra mil mentais priapos...

 

E pelas galerias infinitas,

quanto estalar! Saudosas periquitas

coaxavam seus orgasmos como sapos...

LA 02/02

 

 

 

                 Só Dois Gomos...

 

Caí uma vez no mar: bebi saudade

do que haveria do outro lado do oceano...

Senti que era saudade feito grade —

das bem amargas: cheias de elo humano...

 

Peias do que era possibilidade,

mas sem a posse: um renovado engano —

necessidade após necessidade

caindo em incendiado aeroplano...

 

que trazia a princesa em seu topless,

pra ser beijada apenas de viés

e gostada por brisas e gnomos...

 

Para vê-la corri de bicicleta,

e cantando um pedaço de opereta,

ganhei-lhe mexerica, — só dois gomos.

LA 02/02

 

 

 

          A Sete Chaves

 

Preso pobre, pé-de-chinelo,

cumpriu seus cinco anos e meio,

até que o tempo pingasse

a sua última gota —

e mais alguns barris:

cerca de dois anos e meio de esquecimento...

Isto é, de pena mofo.

..................................................................................

Estava agora, de repente, na porta

da penitenciária ( de segurança máxima ),

farejando o rumo de casa...

como um pássaro tonto a recobrar o fôlego.

 

Preso pobre e evangélico,

ficara todo esse tempo “sem”.

Só punhos punhos punhos... Muitíssimos.

E quanto mais, mais inúteis...

Não adianta, Teobaldo, — lhe dizia

um companheiro de cela,

seminarista experiente —

a coisa tem de ser é ali,

sim, ali ó...

 

Pastor Josias lhe trovejava que sexo

era para formar família...

“Na cadeia? Vade retro!

Coisa do Demo e seus asseclas...

Lembremo-nos do lago de fogo e enxofre!...

Do ranger de dentes!...”

E por aí seguia o pastor

dentro de um silêncio

que nem Deus ousaria quebrar.

.....................................................................................

Atravessou a cidade, andou andou andou...

Vielas, ladeiras, morros... outras encostas...

ruas ruas ruas ruas ruas do Judas... Ru...

as ruas ruas do cu-do-Judas... Ru...

as ruas ruas ruas das meias do Judas...

Ru... enfim, a sua casa: bateu, trêmulo e sôfrego...

Sua cunhada abre a porta. Beijos,

saudades, abraços.

Sua mulher? Onde está Glorinha?!

Atendendo um cliente...Vão

demorar — diz a cunhada —,

foram pra cama agora-agora...

E segredou-lhe: é cara enjoado.

Quem?

O Pastor Josias...

...........................................................................

Olhou para a cunhada,

ela sorriu gulosa...

Pegou-a no colo,

adentrou o quarto ao lado:

jogou-a sobre a cama.

Fechou a porta com duas voltas.

Engoliu a chave.

E agarrou-a,

agarrou-a como se fosse

um enorme pêssego em calda...

E foi aquele brejo em noite de verão —

coaxos e coaxos estrelados coaxos...

e mais coaxos... e mil...

E coaxariam mais e mais

não arrombassem a porta —

estavam com saudades dele ...

Beijos, abraços. Uma festa.

.................................................................................

Antes da janta, coaxou mais quatro vezes —

agora com a sua mulher

que lhe dizia, aos fungos,

sim, lhe jurava

ter se negado ( desde a sua prisão )

a todo e ao mais mínimo orgasmo:

ter guardado a sete chaves seu amor por ele —

para gozar tudo agora agora agora agora

agora agóóóóóóóóó...ra!!!

LA 02/02

 

 

        Perdas E ...

 

Que pena!

As penas

escondiam-lhe a bunda

(um terço dela!!!)

na avenida...

Mas o marido

processou a escola

por perdas, omissão de bens

e encanto.

LA 02/02

 

 

 

                                A Rosa É A Rosa

 

A rosa é a rosa, o resto é flor. Assim

também, você é você, o mais: mulheres.

Uns gostam do jantar, já outros dos talheres...

Uns dão-se a comer vidro, outros pudim.

 

A rosa é a rosa...A pedra tem um sim

pesado. Nem por isso desesperes —

ouvi-lo pode ser o aval do que fizeres,

contanto que comeces pelo fim...

 

A rosa é a rosa... e tu, se não souberes

despetalar com jeito as margaridas,

vais magoar com certeza os bem-me-queres...

 

A rosa é a rosa... As dálias doloridas

fazem amor com o vento sobre o muro...

e choram de saudade dos antúrios.

LA 02/02

 

 

 

            Ver E Fazer

 

Melhor que ver, por certo, é o fazer, —

nem sempre à mão, mas mesmo assim melhor

que ver (e claro!) havendo ou não suor,

aliás: bem mais suado fora o ver...

 

O ver sem ter, na certa, faz verter

aquele intro-suor, porque de cor, —

pois por não ser em sendo é ainda mor

que fingir ser não sendo e, entanto, ser!

 

Ouvir gemer e não poder reter

nas mãos senão do gozo a sua cor,

ah, isto, sim, supõe duro gemer!

 

Ver derreter e não sorver! Que dor

fora mais pétrea, e que olhar a arder

agüentara esse ver sem o fazer?

LA 02/02

 

 

           Sorriso Vertical

 

Em cada pedra a sua consciência,

em cada coração o seu granito.

Não me faltasse tempo, cara Hortênsia,

lhe faria um poema bem bonito.

 

Nosso vizinho, o pobre do Benito,

cuja mulher roubaram ( mas nem pense-a

indo-se contrafeita com o dito

que aqui não cujo ) está sem a cujência.

 

E o pobre, nesse estágio tão precário,

ante esse enorme e baita de problema —

a se coçar abaixo do seu trema,

 

o pobre já não pode, solitário,

dar nos batentes do seu caro )(...

a ostentar uma bela cicatriz.

LA 02/02

 

 

             Negociação

 

Aquela tróia,

cujo nome eu não cujo, se cujasse

causaria um terrível de um impasse, —

aquela tróia é pura paranóia.

 

Vive orando que um Páris a raptasse

do seu bom Menelau, a quem Pinóia,

sua escrava, seria a sua (dele) bóia

nesse mar de tesão a foguear a face...

 

Essa tróia se enfiou lá nos meus olhos:

“Se queres minhas carnes e seus molhos —

tira do bolso 100 das bem verdinhas!...”

 

100 não tos dou, —lhe disse a dedilhar-lhe a polpa...

Mas 20 estão aqui: crocantes de novinhas...

Sorriu-me doce, e foi tirando a roupa.

LA 02/02

 

 

          Mimar-Me Não, Só...

 

Quero falar-me doce, compreender-me

( meu pai só me falava o pancadez,

nunca-jamais podiam socorrer-me —

a não ser nas pancadas de revés...).

 

Quero, mimar-me não, só esquecer-me

de esquecer de lembrar-me estar de vez...

pra descascar-me e nesse fruto ver-me

com a minha esperança de viés...

 

Quero depois fugir com a espanhola

que me ensine a dançar a castanhola —

pelada sobre a cômoda do quarto...

 

Mas nem por isso vou morrer de infarto —

sem antes degustar a tal lasanha

que a Vera faz, mexendo com tamanha...

LA 02/02

 

 

 

          M-u-u-u-u!..., Minha Rosa, M-u-u-u-u-u-u-u!...

 

Fora bom ordenhar tua beleza, —

dela extrair o leite e o mel das horas,

o gozo roxo-róseo das amoras

nas delícias de tua gentileza.

 

Sim: de tua adorável singeleza

beber o belo vinho das auroras...

e o aroma de horas lúcidas, sonoras,

a mugir de prazer-molemoleza...

 

E clintonar-te — bem devagarinho —

os seios de moranga... vindimar-te

a boca, a boca a ejacular saliva...

 

e os sais da afrodisia no cadinho

de tua carne, essa bateia viva —

o leite e o mel no gozo de ordenhar-te.

LA 03/02

 

                         Nus

 

Belas vergonhas nuas entre as árvores,

outras na praia, entre o quebrar das ondas.

Muitas pelo areal pisando conchas,

dependurando ao sol sua libido...

 

Aquelas-lá vieram de mais longe,

tomam banho na bica de água doce...

Escondem erotismo nas entranhas,

mas seus olhos e tato estão com fome.

 

Pingolins murchos e de todo porte

caminham balançando ao lado delas —

exaustos, mortos de cavar a noite...

 

Domingo à tarde voltam às cidades

para seis dias mais no seu trabalho —

na mente: tenridades e seus molhos.

LA 03/02

 

                          

                            Carta Ao Finado

 

Você caiu do tempo,

mas o tempo

continuou viagem.

Sua patroa?

A princípio,

só viagens psíquicas,

aventuras imaginárias

pela física teórica.

Pouco depois, só homenagens

a meio estandarte.

Agora, pra velejar exige

não só o inteiro mastaréu,

mas também todo o convés.

Os amigos,

que antes telefonavam

(  principalmente quando você não estava ),

agora freqüentam a casa

com aquela solidariedade

de dar inveja aos marsupiais.

.................................................................................

Mas sossegue:

deguste a sua paz, meu velho,

que no céu não existem

fechaduras nem suas chaves —

não se casa, nem descasa

ou se usam anéis...

Massada, né?

Pois é. Das pinxotâncias

mister cuidar com cuidado.

Quem pinxotou pinxotou.

Quem não fez —

disfarce, e vá jogar baralho

ou ver as peladas

dos barrigas de almofadas

e cerveja.

Ah...! Quase esquecia:

sua amante, a Nonoca,

continua crocante

e a esfarinhar-se com os mesmos seis...

Se bem que agora em seu lugar ( o sétimo ),

ficou um padre japonês,

baixinho bom de homilia, —

confessa-a todo dia.

.......................................................................

O mais, meu velho, —

a mesma deliciosa merda,

que é estar vivo

e com coceiras.

LA 04/02

 

                   Pela Vinha

 

Quanta noite, buscando-te o epicentro,

eu não alavanquei todo o universo!

Fiz questão de saber-te em prosa e verso, —

crua ou cozida, com ou sem coentro.

 

Te hasteei a rósea rosa no por dentro

do nosso jogo a arder seu dom imerso, —

um gozo estrangulado, ora perverso,

ora santo: um templo em que me adentro.

 

A brisa traz o verde lá do vale...

e me vejo abraçado — em noite calma —

com a carne cheirosa do convale...

 

Sim: há um cheiro de uvas no beijar-te,

um arrepio de pele ( corpo e alma )

pelas veredas outonais de vindimar-te.

LA 04/02

 

                              ... ais de bruma...

 

Permiti-me falar de coisa alguma,

porém que tenha alguma essência-nexo

e não rime com plexo nem com sexo —

a não ser que tal som, que a horta estruma,

 

nos dê colher a fruta que se assuma

em forma de xoxola em dom complexo:

bateia e vai-e-vem, —com tal reflexo,

que o gozo se transforme em ais de bruma...

 

E o frei então, sem graça, erga a calça

e pague à moça, e corra para a missa —

com a alma —agora leve— a andar descalça...

 

Permiti vos perceba a voz sensual

a deslizar da glote do coral

que pros lados da carne se espreguiça.

LA 04/02